Opinião/ Alexandre Chiure - Ecos do Conselho Nacional da Renamo
No fundo, o documento em causa não é novo. É produto do último congresso desta organização política que elegeu Ossufo Momade como sucesso de Afonso Dhlakama, em 2019.
O que a direcção de Ossufo Momade fez foi sacudir a poeira que estava em cima do documento e trazê-lo à reunião como anexo do regulamento para a eleição dos órgãos electivos do partido.
É verdade que a decisão final sobre o perfil será tomada no congresso de 15 a 17 de Maio, na Zambézia, mas há que admitir que houve preguiça da parte dos membros do Conselho Nacional (CN) ao remeter o documento, assim como está, sem se dar ao trabalho de o actualizar. Os objectivos que se pretendiam atingir naquela época não são os mesmos de hoje.
A expectativa dos membros e simpatizantes da Renamo e do público em geral que acompanha a vida política do país é que o próximo presidente esteja à altura do momento que o país atravessa. Alguém que possa trazer uma nova dinâmica. Uma outra forma de ser e estar no partido, o que pressupõe uma candidatura jovem.
Entende-se que cada processo tem as suas regras e o que a Renamo quer é evitar a vulgarização das funções de presidente do partido, tudo bem. Seja como for, faltou o debate em torno do documento para verificar se os itens arrolados continuam actuais ou não e se se deve ou não introduzir outros.
Para começar, assim como está, o perfil está armadilhado. Primeiro, veda a possibilidade de uma candidatura da juventude. Estabelece que os concorrentes devem, entre outros requisitos, possuir 15 anos de militância e terem exercido, entre outros cargos, o de secretário-geral do partido e chefe de um departamento nacional. Além disso, consta que fixa como idade mínima 35 anos.
Isso quer dizer que alguém que tenha ingressado na Renamo com 18 anos, mesmo que com 15 anos de membro feitos, não pode concorrer para o cargo de presidente do partido porque teria 33 anos de idade.
É verdade que estes indicadores têm o peso que tem na selecção do candidato que a Renamo pretende, mas é preciso ter a consciência de que por si só não garantem a qualidade do indivíduo. Ter sido chefe de um ou de outro sector não significa, de forma alguma, que essa pessoa seja competente.
E mais. O concorrente à sucessão de Ossufo Momade pode até ser aquele que mais cargos de chefia exerceu dentro do partido, mas não ser, por exemplo, uma figura de consenso.
A outra coisa importante é que a Renamo devia verificar, entre os seus quadros, quais são aqueles que têm um bom capital político. Parecendo que não, esse factor é crucial. É que se o objectivo da “perdiz” é ganhar eleições, tem que mudar de atitude. Não pode concorrer só para o cumprimento do calendário, como tem acontecido.
É preciso apostar em cavalos que correm. Buscar, nem que seja fora do partido, alguém que faça a diferença. Que arrasta as massas e tenha aceitação perante o público. Uma figura que possa concorrer em pé de igualdade com o candidato da Frelimo. Um líder carismático.
Da forma como as coisas estão, o cenário possível será de recondução de Ossufo Momade no congresso da Zambézia, com a vantagem de estar em frente da Renamo, com os riscos que isso representa em termos de voto para o partido.
É que há a indicação de que ninguém mais quer Ossufo à frente deste partido. Fazendo uma leitura do cenário político do país, se a Renamo insistir em concorrer com ele nas presidenciais, poderá ter piores resultados eleitorais, o que significaria a perda da sua base de apoio.
Venâncio Mondlane pode ter cometido erros na condução do seu processo de candidatura e no estabelecimento de alianças internas. Admite-se que tenha tido excessos em alguns aspectos, mas, quer queiramos, quer não, ele é, neste momento, o quadro da Renamo com um capital político acima da média e que arrasta consigo a juventude, determinante em processos eleitorais.
Nas eleições autárquicas de Outubro de 2023 em que foi cabeça-de-lista, alcançou resultados históricos ou jamais registados pela Renamo, em eleições autárquicas e não só, na cidade de Maputo, mesmo nos tempos de Afonso Dhlakama, ao conseguir 33,59 por cento dos votos. Num partido sério, uma figura destas, era de acarinhar, no lugar de hostilizá-la, como está a acontecer.
Aliás, se formos a ver, o perfil chancelado pelo Conselho Nacional visa afastar quaisquer possibilidades de VM7 concorrer para o cargo de presidente da Renamo e, por via disso, constituir-se candidato deste partido às eleições presidenciais.
Manuel de Araújo, outro quadro com um bom capital político, também não tem hipótese de entrar na corrida porque o CN introduziu uma emenda que diz que os 15 anos de militância exigidos no perfil devem ser ininterruptos, o que não é o seu caso, pois, em algum momento, ele abandonou a Renamo e ingressou no MDM.
A Renamo perdeu a oportunidade de, através do seu Conselho Nacional, promover a sua união interna. O que se viu na sessão de abertura foram discursos violentos, carregados de ódio e incitação à violência contra Venâncio Mondlane, o que é grave.
Num discurso incendiário e em tom de ameaça, um ex-guerrilheiro da Renamo, depois de referir que há pessoas que andam a falar mal do partido e de Ossufo Momade em alguns canais de televisão, disse que os antigos guerrilheiros têm remédio para curar esse mal, bastando para isso autorização do CN ou do próprio presidente do partido para avançarem. O que é que querem dizer com isso? O mais grave do que isso é que esse homem foi aplaudido, efusivamente, na sala.
O que eu esperava era que se fechassem numa sala e discutissem o futuro da Renamo. Se necessário pegarem-se pelas golas. Insultarem-se uns aos outros e, inclusive, chamarem-se nomes e no fim da reunião saírem coesos e unidos em torno dos objectivos políticos do seu partido. Infelizmente a reunião do Conselho Nacional cimentou as divergências entre Ossufo Momade e Venâncio Mondlane. Até onde vamos chegar? (X)
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